Wednesday, 7 December 2011

Don't Expect Too Much, Susan Ray

(Nick Ray, porque como dizia um amigo meu,
"ele é muito badass para ser Nicholas Ray")

Don't Expect Too Much, o documentário da mulher de Nicholas Ray, como objecto fílmico não é nada de especial: aquela irritante voz off robótica, a mudança de cenários a quando dos depoimentos, a falta de uma linha continua de pensamento e a construção e montagem um pouco amadora deixam muito a desejar. Porém, como documentário que dá a conhecer um pouco da essência, da forma de ver a vida e de ver o Cinema de Nick Ray, esta é uma excelente maneira de iniciamento na sua filmografia.
Nicholas Ray era um visionário, em nome da experiência e da quebra de regras, em nome do Cinema, fez a desconstrução do som e da imagem através da combinação de diversas formas de vídeos no seu filme inacabado e malogrado We Can't Go Home Again. Indo contra as regras típicas de contar uma história, tanto a nível narrativo como visual, tudo porque não queria "ver um rectângulo no ecrã", Nick Ray recorreu à projecção de imagens multiplas em simultâneo. Toda esta veia experimental de Ray mais evidente no final da sua vida e da sua carreira não deixa de ser um bocadinho angustiante para o espectador que vê as esperanças do realizador em relação a esta forma nova e excitante de fazer Cinema a irem por água a baixo. Muitas destas suas ideias foram esquecidas e o que supostamente ia revolucionar o Cinema acabou por chatear os críticos e deixar os espectadores confusos.
Mas Don't Expect Too Much mostra mais além disso. Mostra, como professor e cineasta, a crença de Nick Ray de que todos que faziam parte de um filme deviam trabalhar como um colectivo, fazendo de tudo um pouco, dominando toda a arte de fazer Cinema, não apenas um aspecto redutível dela. (Não consigo deixar de pensar como esta ideia de Nicholas Ray devia ser mais aplicada hoje em dia nas escolas de Cinema).
Por outro lado, como realizador, Ray é um cineasta que valoriza os actores, que os põe no centro de toda a composição cinematográfica. Eles e as suas emoções cruas e nuas são o centro de tudo, e a câmara é somente um meio de valorizar os actores, de os mostrar, nada mais. A câmara é um objecto à mercê dos actores e todas as outras experiências técnicas que são feitas com ela, de planos, de ângulos, são "pseudo-intelectualidades". Nicholas Ray diz-nos isso. Apesar de não concordar (basta olhar para os filmes de Antonioni e como os seus movimentos de câmara captam o pulsar dos espaços, das personagens e das suas angústias), é impossível ficar indiferente à forma como Ray vê o Cinema.
Por fim, o filme de Susan Ray mostra a descida em espiral de Nicholas Ray, a sua personalidade auto-destrutiva e desiludida com a vida. Como Godard que com 81 anos continua com ideias e prossegue na desconstrução do cinema (daí que tantos críticos digam que ele filma como um jovem), Nicholas Ray tinha ideias, continuava a ter algo a dizer, porém já ninguém o queria ouvir e o que (os críticos) nutriam por ele era admiração pelo que tinha sido e (os seus alunos) piedade daquele professor inovador e genial que se afogava intempestivamente nas suas próprias mágoas.

Ladies and gentlemen, film is a way of life. I can't teach you how to make films.
- Nicholas Ray

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